quarta-feira, setembro 14, 2011

Impermanência 2

Saudade

Já escutava a voz da mãe mesmo antes de abrir os olhos. Por algum tempo, aquele colo era tudo o que queria. O som de ninar. Até poder ficar no chão.

Quando conseguiu alcançar o brinquedo ficou toda alegre. Ainda queria aquele colo. Alcançar o mundo era bem mais interessante. Até conseguir correr.

Correr por correr. Correr para se divertir. Correr é bem melhor do que andar. Cochilar, sonhar, sorrir. Até aprender a falar.

Quando aprendeu a falar, logo logo aprendeu a perguntar. Não é incrível como tudo tem um porquê? Para aprender, é preciso escutar. Sim, NÃO, Mais NÃO do que Sim. Quando viu, já era uma mocinha.

Uma pequena senhorita, como dizia sua avó. Brincou de boneca, brincou de casinha, brincou de trabalhar. O tempo passa muito rápido quando a gente pode brincar.

Um belo dia se apaixonou. E no outro, se decepcionou. Correu para o colo da mãe, tagarelou com as amigas, fez perguntas ao diário. A moça sabia correr da tristeza e alcançar o mundo era bem mais interessante. Até que aprendeu a amar.

A mulher teve uma boneca. Montou uma casa. Começou a trabalhar. Relógio, planos e malas. O tempo passa rápido quando a gente precisa caminhar.

Deu colo, repondeu perguntas, disse mais não do que sim. Aprendeu mais uma vez a escutar. Aprendeu a amar.

O tempo passa rápido quando a gente precisa sonhar. E a mulher virou uma senhora, cheia de histórias para contar. Quem queria escutar? Se pudesse, ela correria. Agora mal conseguia andar.

Sentada na sua casinha, depois de abraçar o mundo e voltar, nada a deixaria mais alegre do que poder escutar de novo aquele ninar. Sentir aquele colo, poder fechar os olhos e nunca mais se importar com o tempo que corre. Corre por correr, corre para se divertir, e nem se importa em avisar.

-Renata M. Cardoso (além de grande amiga, uma excelente escritora)

Um comentário:

Shirley Guimarães de Mello disse...

Impressionante como o texto literário é capaz de passar um ensinamento de forma tão clara e tão cativante, não acha? É por essas o outras que as histórias fazem milagres, são sagradas... Parabéns pra Renata pelo lindo texto e pra vc, Leo, por pescar o sentido filosófico e compartilhar com tantos. bjs com saudade, Shirley